Grupo de investigação identifica gene que vai permitir melhorar a previsão de quando os sintomas da Machado-Joseph vão surgir
Um estudo desenvolvido por um grupo de investigação liderado por Manuela Lima,
da Universidade dos Açores, permitiu descobrir um gene que influencia a idade de
início da doença de Machado-Joseph. O gene da Apolipoproteína E, uma proteína
que participa no transporte e no metabolismo do colesterol, tem um papel
modificador na doença de Machado-Joseph, estando a presença de uma variante
específica deste gene associada a um início mais precoce dos sintomas da doença.
A partir desta descoberta é possível saber que uma pessoa, que tem a alteração
genética que causa a doença de Machado-Joseph e tem uma alteração genética no
gene da Apolipoproteína E (APOE), vai ter uma idade de início da enfermidade
mais precoce. Esta nova contribuição vai permitir melhorar a previsão do início
da doença e, em estudos futuros, poderão ser desenvolvidas terapias dirigidas a
este gene de modo a que se possa atrasar, de alguma forma, o seu início.
“Trata-se de mais conhecimentos sobre os aspectos genéticos desta doença e que
podem permitir o desenvolvimento de terapias que possam pelo menos atrasar o seu
início”, revelou a investigadora Conceição Bettencourt. Para já estes novos
dados vão dar aos geneticistas novos meios para os ajudar a prever o início da
doença, constituindo assim mais um elemento para o aconselhamento genético. A
responsável pelo estudo, Manuela Lima, explica que poderão existir outros genes
que permitam perceber melhor quando é que a doença vai começar. “Este é o
primeiro que ajuda a melhorar a previsão mas não permite prever em absoluto,
apenas melhorar a previsão”, esclarece a investigadora. Uma das características
da doença de Machado-Joseph, uma ataxia (falta de coordenação nos movimentos do
corpo) hereditária de manifestação habitualmente tardia, é a elevada
variabilidade clínica patente nos extremos das idades em que aparecem os
primeiros sinais (dos 4 aos 70 anos). Este estudo foi publicado em Dezembro de
2011 na revista “Archives of Neurology”, tendo como primeira autora Conceição
Bettencourt. O trabalho foi desenvolvido com o objectivo de contribuir para a
compreensão da doença de Machado-Joseph e exigiu a análise de cerca de 200
doentes naturais dos Açores, de Portugal Continental e do Brasil. Manuela Lima
salientou ainda a importância do trabalho colaborativo neste estudo. “Numa
doença mundialmente rara apenas a colaboração entre diferentes equipas pode
permitir o progresso do conhecimento. No caso deste trabalho a colaboração
nacional com o grupo do professor Jorge Sequeiros e a cooperação internacional
da professora Laura Jardim, que é do Brasil”, afirmou. A investigadora realçou
ainda a importância da parceria com o serviço de neurologia do Hospital do
Divino Espírito Santo no desenvolvimento do trabalho, que pretende, através da
análise da variabilidade genética e da sua associação com a componente clínica,
obter ferramentas mais eficazes com vista à previsão da idade de início, bem
como a compreensão das alterações que caracterizam a progressão e a severidade
da doença.• O que causa a doença de Machado-Joseph? A doença de Machado-Joseph é
causada pela alteração de um gene localizado no cromossoma 14, que codifica uma
proteína designada de “ataxina-3”. A doença é dominante, o que significa que
basta uma dose do gene mutado (alterado), herdado a partir do pai ou da mãe,
para a fazer surgir. Localizada no cromossoma 14 em 1993 e identificada um ano
mais tarde, a mutação na base desta doença corresponde a uma repetição de um
motivo de três bases de DNA. Essa repetição leva à formação da proteína
alterada, que adquire uma função neurotóxica através de mecanismos ainda pouco
conhecidos mas que estão a ser intensamente estudados. A compreensão destes
mecanismos assume um papel fundamental, já que a possibilidade de terapia para
esta doença está intimamente relacionada com o conhecimento acerca da função da
proteína e dos efeitos fisiológicos associados.
ANA CARVALHO MELO
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