Cognição e emoção em cerebelopatias
Os
problemas nas áreas da cognição e emoção estão relacionados com a lesão cerebelosa
na ataxia?
Sim, podem estar. O cerebelo
tem sido, desde há muito, conhecido ser importante para o controle motor, e as
pessoas com distúrbios atáxicos sentem dificuldades motoras, inclusive marcha
instável (ataxia) com base ampla, incoordenação dos braços e pernas, fala
arrastada, e anomalias nos movimentos oculares. Sabemos agora que o cerebelo,
como o córtex cerebral, tem algumas partes que são críticas para o movimento, e
outras partes que desempenham um papel na cognição e emoção. O cerebelo motor está
relacionado com o córtex motor que governa os movimentos; enquanto que as
regiões não-motoras do cerebelo estão ligadas a áreas de “associação” cortical
cerebelosa importantes para o pensamento, raciocínio, motivação, memória e
sentimentos. As lesões no cerebelo não-motor perturbam estas ligações
cerebelosas com áreas corticais cerebrais do pensamento, e podem levar a dificuldades
em funções intelectuais e a alterações de humor e personalidade. Os distúrbios
atáxicos também podem produzir neurodegeneração em partes do córtex cerebral importante
para o intelecto, outra razão pela qual os pacientes com ataxia podem ter
problemas com estas funções.
Que
tipos de problemas psicológicos podem ser causados por lesões ou distúrbios
cerebelosos?
A síndrome afetiva cognitiva
cerebelosa é o conjunto de problemas que surge quando o cerebelo não-motor é danificado.
Inclui deficiências na função executiva, análise visual-espacial e défices
selecionados nas competências linguísticas, bem como alterações na
personalidade e comportamento. Pode haver dificuldades com a polivalência, o
planeamento e a organização. As atividades da vida diária que exijam
flexibilidade intelectual e que eram anteriormente realizadas automaticamente,
podem exigir esforço consciente e novas estratégias. Pode haver dificuldades em
expressar pensamentos lógicos e coerentes, e problemas de memória,
particularmente com o trabalho. As alterações de humor incluem depressão,
apatia, irritabilidade e tolerância limitada à frustração. A interação
psicossocial pode ser prejudicada, particularmente em crianças com lesão
cerebelosa. A demência é incomum na doença cerebelosa, mas pode ser um problema
naqueles distúrbios atáxicos que afetam vastas áreas da o córtex cerebral. O
papel do cerebelo na dislexia, défice de atenção e hiperatividade, distúrbios
do espectro autista, esquizofrenia, atraso no desenvolvimento e distúrbio do
pânico, está sob investigação ativa.
Porque
é que isso é importante para o paciente atáxico?
Os pacientes cerebelosos e
as suas famílias geralmente acham útil saber que os problemas cognitivos e
psiquiátricos podem ocorrer como um resultado direto da doença. Estes desafios,
para além do controle motor, não estão "na sua cabeça", mas no seu
cérebro. Estas dificuldades não são culpa do indivíduo afetado, membros da família
ou prestadores de cuidados de saúde. É também útil saber que o stress causado
pela doença crónica e as alterações sociais resultantes podem resultar em
encargos adicionais sobre os pacientes e as suas famílias. Reconhecer a base
cerebral destas mudanças mentais e de humor, juntamente com questões sociais e
psicológicas difíceis que vêm com a doença, é o primeiro passo essencial que
conduz ao tratamento. Os pais de crianças com atraso no desenvolvimento devido a
doença cerebelosa podem ter que lidar com muitos desafios psicossociais e
intelectuais especiais, mesmo que haja apenas uma ataxia mínima ou nenhuma.
O
que pode ser feito em prol do paciente atáxico?
A resposta definitiva é
prevenir ou curar a própria doença cerebelosa. Mesmo na ausência de uma cura,
ainda é possível melhorar substancialmente a qualidade de vida por meio de
tratamento de distúrbios cognitivos e psiquiátricos através de terapias, tais
como medicamentos, reabilitação cognitiva, aconselhamento psicológico e intervenções
ambientais. Os médicos de cuidados primários e neurologistas devem ser capazes
de administrar estes aspetos. Nos casos mais difíceis ou complicados, a consulta
com um especialista em ataxia, neurologista comportamental ou psiquiatra com
experiência em questões de tratamento cognitivo e de humor, pode ser necessária.
O sucesso do tratamento depende de uma profunda avaliação de modo a utilizar a
medicação mais adequada e intervenções adaptadas às necessidades de cada
indivíduo. As crianças com desafios cognitivos e psicossociais precisam de
atenção especial, e podem ficar bem com o tempo e reabilitação intensiva.
Existe
alguma investigação em curso?
Sim. Há uma nova e vibrante
área de investigação: a neurociência cognitiva do cerebelo. Inclui estudos
anatómicos e comportamentais em modelos animais, como bem como estudos de
imagem funcional e clínico investigações em pacientes e controles saudáveis.
(artigo traduzido)
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