Ataxia de Friedreich
A ataxia de Friedreich é uma
doença hereditária (genética) que condiciona uma deterioração de determinadas
células nervosas ao longo do tempo. Em muitos casos, esta doença afeta
igualmente o coração, alguns ossos e as células no pâncreas que produzem insulina.
A doença começa tipicamente por uma dificuldade na marcha. As pessoas com
ataxia de Friedreich desenvolvem movimentos trémulos e desajeitados nas pernas
(denominada marcha atáxica) durante a infância ou o início da adolescência.
Em casos raros, os sintomas
surgem na primeira infância ou em adultos de meia-idade. À medida que a doença
se agrava, as pessoas podem desenvolver deformidades ósseas ao nível da coluna
e dos pés, perda de sensibilidade nos membros, problemas na fala, movimentos
oculares anormais, doença cardíaca e diabetes.
Os cientistas descobriram
que muitos dos sintomas de ataxia de Friedreich se encontram relacionados com
níveis anormalmente baixos de frataxina, uma proteína que ajuda a proteger as
células dos “radicais livres”, produtos residuais tóxicos (venenosos) que
resultam da produção de energia pelas células. Numa pessoa com ataxia de
Friedreich, um segmento do código genético no cromossoma 9 pode ter até 1.000
repetições em vez de um número normal entre 7 e 22. Estas repetições produzem
um erro que conduz a uma diminuição da produção de frataxina. À medida que os
radicais livres se acumulam dentro das células e que um número progressivamente
maior de células é destruído ou alterado, os efeitos a longo prazo da ataxia de
Friedreich conduzem a uma medula espinhal atrofiada, a um aumento do músculo
cardíaco, a perturbações na fala e nos movimentos dos olhos e à perda de
capacidade do pâncreas para regular o açúcar no sangue. Por fim, quase todas as
pessoas com ataxia de Friedreich ficam confinadas a uma cadeira de rodas e uma
grande percentagem de pessoas desenvolve problemas cardíacos graves, incluindo
insuficiência cardíaca.
A ataxia de Friedreich é uma
doença autossómica recessiva, o que significa que é necessário que ambas as
cópias de cromossoma 9 (temos em todos os cromossomas uma cópia de cada
progenitor) sejam anormais. As pessoas que herdam apenas uma cópia anormal
(número estimado de aproximadamente um em cada 100 portugueses) não têm a
doença, mas são “portadoras” que podem transmitir o cromossoma anormal aos seus
filhos. Nos casos em que o cromossoma seja transmitido ao filho (o que acontece
em 1 em cada 2 casos), se o cromossoma que vier do outro progenitor for normal,
o filho também não irá ter manifestações de doença e será portador. Apenas se o
outro cromossoma também tiver aquela região alterada se irá desenvolver a
doença.
Em Portugal, existe uma
probabilidade de um para 45.000 que uma criança herde duas cópias do cromossoma
9 anormal que produz a ataxia de Friedreich.
Em 85% dos casos, os
sintomas desenvolvem-se antes dos 25 anos de idade, mas isso só raramente
acontece antes dos 5 anos. Embora as pessoas de todas as regiões do mundo
possam sofrer de ataxia de Friedreich, os estudos mostram que a sua ascendência
é quase sempre europeia, norte-africana, do Médio Oriente ou indiana
(indo-europeia).
Sintomas
Uma vez que a ataxia de
Friedreich afecta muitos órgãos, esta doença pode produzir uma grande variedade
de sinais e sintomas:
Os sintomas neuromusculares
que envolvem os membros incluem movimentos trémulos e desajeitados
(atáxicos) dos braços e das pernas, dificuldade na marcha, paralisia dos
músculos das pernas, dificuldade em mover os braços e perda da sensibilidade
(especialmente da sensibilidade vibratória e postural) nos membros.
Os problemas
neurológicos incluem a dificuldade em falar (geralmente com um padrão de
discurso lento e hesitante), movimentos rápidos, involuntários e espasmódicos
dos olhos (nistagmo), visão reduzida e perda de audição.
As deformidades ósseas
da coluna e dos pés (geralmente desencadeadas pelos problemas
neuromusculares) incluem uma curvatura da coluna (escoliose), pés arqueados, pé
boto, deformidades dos dedos dos pés e inversão do pé.
Os sintomas cardíacos podem
incluir falta de ar (especialmente com o esforço), dor no peito, frequência
cardíaca a0normalmente rápida ou irregular e sintomas de insuficiência cardíaca
(inchaço das pernas, dificuldade em respirar quando o doente está deitado na
horizontal, despertar de noite para urinar).
Os sintomas de diabetes (que
ocorre em 10% dos casos) incluem sede extrema, idas frequentes à casa-de-banho
para urinar, perda de peso, fadiga e visão turva.
Na maior parte dos casos, as
pessoas com um número muito elevado de repetições genéticas no referido
segmento do cromossoma 9 tendem a desenvolver a doença mais precocemente do que
as outras e apresentam sintomas mais graves. As pessoas com um número
relativamente baixo de repetições podem não desenvolver sintomas até aos 30 a
40 anos e podem não apresentar problemas cardíacos graves.
Diagnóstico
O médico irá rever os
sintomas do doente, a sua história clínica, bem como qualquer história familiar
de doenças neuromusculares. Será feito um exame físico pormenorizado, prestando
especial atenção ao coração, e um exame neurológico, com particular atenção às
pernas, braços e olhos. Em seguida, dependendo dos achados, o médico pode pedir
um ou mais dos seguintes exames diagnósticos:
Estudos da condução nervosa –
Determina se a lesão das células nervosas diminuiu a velocidade com que os
impulsos nervosos são transmitidos.
Eletromiograma –
Procura identificar a presença de uma lesão muscular.
Eletrocardiograma –
Pesquisa anomalias dos batimentos cardíacos.
Ecocardiograma – Avalia
a função cardíaca, mede a espessura do músculo cardíaco e determina o tamanho
das câmaras cardíacas, as aurículas e os ventrículos.
Ressonância magnética
nuclear – Avalia o cérebro e a medula espinhal para procurar identificar
sinais de deterioração destas estruturas, especialmente uma diminuição da sua
espessura da medula espinhal.
Análises de sangue e de
urina – Pesquisam a presença de açúcar elevado no sangue (hiperglicemia) e
procuram excluir outras doenças que podem simular a ataxia de Friedreich.
Monitorização de Holter –
Registo eletrocardiográfico contínuo, durante 24 horas, para procurar
identificar a presença de batimentos cardíacos irregulares potencialmente
perigosos.
Os testes genéticos podem
confirmar a anomalia cromossómica que causa a ataxia de Friedreich.
Duração
esperada
A ataxia de Friedreich é uma
doença hereditária (genética) que se encontra presente quando do nascimento e
que persiste durante toda a vida.
Prevenção
Em consulta de genética,
mediante a realização dos testes genéticos necessários e de “aconselhamento
genético”, as pessoas afetadas ou seus familiares podem obter informação sobre
o risco que apresentam de transmitir a ataxia de Friedreich aos filhos e sobre
quais as opções reprodutivas que existem.
Tratamento
Não existe forma de corrigir
ou remover as repetições suplementares que causam a ataxia de Friedreich. O
tratamento incide no alívio dos sintomas, em evitar que o problema se agrave e
no prolongamento da vida. O tratamento pode incluir:
Fisioterapia e terapia
ocupacional
Utilização de talas ou
cirurgia corretora das deformidades ósseas – Se a escoliose for acentuada, a
cirurgia é geralmente realizada numa idade relativamente precoce (se possível),
pois, mais tarde, com o desenvolvimento de doença cardíaca, a operação pode ser
mais arriscada.
Medicação para a doença
cardíaca – Alguns medicamentos habitualmente utilizados incluem os
beta-bloqueantes, como o metoprolol, e os bloqueadores dos canais do cálcio,
como o verapamil.
As substâncias
antioxidantes, como a vitamina E, a coenzima Q10 e a idebenona, podem atrasar
potencialmente a progressão da doença.
Tratamento para reduzir o
açúcar no sangue – Inclui uma modificação da dieta, juntamente com medicamentos
antidiabéticos orais ou insulina.
Quando
contactar um profissional
Se um familiar próximo tiver
uma ataxia de Friedreich, peça ao seu médico referenciação a uma consulta de
genética, onde lhe será explicado qual o seu risco de ser portador desta
doença. Dependendo da sua relação com a pessoa afetada, o médico geneticista pode
sugerir a realização de testes genéticos antes ter filhos.
Prognóstico
O prognóstico depende de
muitos fatores, incluindo a idade em que os sintomas têm início (quanto mais
cedo começarem os sintomas, pior o prognóstico), a sua gravidade e a qualidade
dos cuidados médicos. As pessoas com uma ataxia de Friedreich ficam tipicamente
confinadas a uma cadeira de rodas 15 a 20 anos após o início dos sintomas,
podendo muitas delas ficar incapacitadas.
A morte na idade adulta é
comum, geralmente devido à doença cardíaca. No entanto, com cuidados médicos
adequados, algumas pessoas com casos menos graves podem viver até aos sessenta
ou setenta anos.
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